Espiritismo e Política

Em que consiste a missão dos Espíritos encarnados? – Em instruir os homens, em lhes auxiliar o progresso; em lhes melhorar as instituições, por meios diretos e materiais. (Questão nº 573 de O Livro dos Espíritos)

Haverá alguma relação entre Espiritismo e Política? Esta é uma pergunta que em muitos lugares temos lido e para a qual há sempre uma resposta negativa: Espiritismo nada tem a ver com Política. No entanto, tais respostas apressadas e muitas vezes, vazadas em preocupante tom de que seja até “uma falha”, são frutos de desinformação e de preconceitos consagrados.

Sob o aspecto filosófico, o Espiritismo tem a ver e muito com a Política, já que esta deve ser a arte de administrar a sociedade de forma justa.

Em sua obra básica, O livro dos Espíritos, o Espiritismo consagra 405 questões, ou seja, da pergunta nº 614 à 932, para tratar das Leis de Adoração, Trabalho, Reprodução, Conservação, Destruição, Sociedade, Progresso, Igualdade, Liberdade e Justiça, Amor e Caridade. Tais questões envolvem, portanto, o homem no seu relacionamento com o Criador da Vida, com o Planeta em que vive, com seus semelhantes, com as sociedades de que participa.

Logo, sob o aspecto filosófico, o Espiritismo apresenta normas políticas.

O que não se deve, nem se pode, é confundir essa visão política com a política partidária, ou seja, a política aplicada que os homens devem exercitar nos núcleos, nas agremiações partidárias.

Tais partidos são resultantes de ideologias, de objetivos, de programas, de estatutos estabelecidos em agrupamentos de determinados  homens que visam, de uma forma ou de outra, realizar normas políticas ideais, ou seja, pretendem a execução na sociedade, dos princípios, das normas apresentadas filosoficamente pela política.

Assim, jamais o Espiritismo, como Doutrina, e o Movimento Espírita, como prática, poderão dar guarida a um partido político em seu seio, por exemplo: Partido Social Espírita, Partido Espírita Cristão, etc.

Porém, as implicações dos princípios e normas políticas contidas na Terceira Parte – Das Leis Morais – de O Livro dos Espíritos, codificado por Allan Kardec, são muito amplas e profundas na sociedade humana.

Por isso, o espírita deve ser consciente e lúcido na compreensão dessas normas e princípios, a fim de que sua participação na sociedade seja apropriada com tal visão política, e que necessariamente impõe exercitar a Justiça, o Amor e a Caridade.

Esse entendimento é necessário ao espírita, pois conscientemente ou não, ele tem uma prática política, considerando-se que a própria participação na sociedade é uma participação política.

Assim, as pessoas, as famílias e as instituições sociais necessitam da paz baseada na justiça, na ordem e na segurança e de condições para a realização do bem comum. Para tanto, os homens associam-se em entidades mais amplas, gerando a sociedade política, personificada no Estado que, desta forma, se torna o responsável pelo bem de todas as pessoas.

AÇÃO ESPÍRITA E POLÍTICA

Para progredir, o homem precisa da sociedade. O progresso não é o mesmo para todos, então os mais adiantados devem ajudar o progresso dos outros por meio do contato social.

Esse auxílio, essa participação é uma ação política, embora possa não ser (e na maioria das vezes não o é) uma ação político-partidária. Para o espírita, essa ação política deve ser sempre inspirada nos princípios expressos pelo aspecto filosófico do Espiritismo, que o levam a amar, e nesse caso Amar é desejar o bem, logo, a exteriorização política do amor é a expressão do querer bem e do agir para o bem de todos.

Alerta-nos o Espiritismo que o progresso intelectual realizado até o presente, em larga escala, é um grande avanço e assinala uma primeira fase de desenvolvimento da humanidade, sendo impotente, porém, para regenerá-la. Enquanto o homem estiver dominado pelo orgulho e pelo egoísmo ele utilizará sua inteligência e seus conhecimentos para satisfazer suas paixões e seus interesses pessoais, não se importando em prejudicar seu semelhante e até mesmo destruí-lo.

Somente quando, através do progresso moral, o homem dominar o orgulho e o egoísmo, ele poderá ampliar sua felicidade na Terra, podendo então, desfrutar da paz e da fraternidade.

Isso só será possível quando os homens considerarem que, como irmãos devem-se auxiliar mutuamente e não o forte e poderoso explorar e viver às custas do mais fraco. (A Gênese – Allan Kardec – Cap. XVIII- 18-19)

Na mesma obra Allan Kardec revela os caracteres daqueles que devem participar da estruturação de uma sociedade justa e amorosa: “Cabendo-lhes fundar a era do progresso moral, a nova geração se distingue por inteligência e razão geralmente precoces, juntas ao sentimento inato do bem e a crença a espiritualistas, o que constitui sinal indubitável de certo grau de adiantamento anterior. Não será composta de Espíritos eminentemente superiores, mas dos que, já tendo progredido, se acham predispostos a assimilar todas as ideias progressistas e aptos a secundar o movimento de regeneração.”

Consequentemente, a ação política dos bons é um imperativo na hora atual. O Espiritismo apresenta conceitos claros e precisos para essa atuação. “A nova geração marchará, para a realização de todas as ideias humanitárias compatíveis com o grau de adiantamento a que houver chegado. Avançando para o mesmo alvo e realizando seus objetivos, o Espiritismo se encontrará com ela no mesmo terreno. Aos homens progressistas se deparará nas ideias espíritas poderosa alavanca e o Espiritismo achará, nos novos homens, Espíritos inteiramente dispostos a acolhê-lo.”

“O Espiritismo não cria a renovação social; a madureza da humanidade é que fará dessa renovação uma necessidade. Pelo seu poder moralizador, por suas tendências progressistas, pela amplitude de suas vistas, pelas generalidades das questões que abrange, o Espiritismo é mais apto do que qualquer outra doutrina a secundar o movimento de regeneração; por isso, é ele contemporâneo desse movimento. Surgiu na hora em que podia ser de utilidade, visto que também para ele os tempos são chegados.” (A Gênese – Allan Kardec)

Da análise dos conceitos expostos surge clara a estimulação do Espiritismo à participação no processo político, social, cultural, econômico, de modo a secundar o movimento de regeneração da sociedade humana em bases de justiça e amor.

Para tal ação é imprescindível que se tome conhecimento dos princípios e normas da Doutrina Social Espírita, contida em O Livro dos Espíritos, em sua Terceira Parte.

PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DO ESPÍRITA

Sirva de base às instituições sociais, as relações legais de povo a povo e de homem a homem o princípio da caridade e da fraternidade e cada um pensará menos na sua pessoa, assim veja que outros nela pensaram. Todos experimentarão a influência moralizadora do exemplo e do contato.” (O Livro dos Espíritos – Perg. 917)

Desta análise sintética dos princípios e fundamentos do Espiritismo, com base em O Livro dos Espíritos, e suas correlações com a Filosofia, Sociologia e Política e a visão de que o homem no mundo “é um ser social e consequentemente um ser político” concluímos:

COMO O ESPÍRITA NÃO DEVE ATUAR NA POLÍTICA:

-Levar a política partidária para dentro do Centro, das Entidades ou do Movimento Espírita;

-Utilizar-se de médiuns e dirigentes espíritas para apoiar políticos partidários candidatos a cargos eletivos aos Poderes Executivos e Legislativos;

-Pegar votos para políticos que às vezes, dão alguma “verbinha” para asilos, creches e hospitais, mas cuja conduta política não se afina com os princípios éticos ou morais do Espiritismo.

-Apoiar políticos que se dizem espíritas ou cristãos, mas aprovam as injustiças, as barganhas, a “politicagem” (usar a política partidária para interesses egoísticos pessoais ou de grupos a que se ligam);

-Participar da política partidária apenas por interesse pessoal, para melhorar a sua vida e de sua família, divorciado em sua militância político-partidária dos princípios e normas da Filosofia Espírita.

COMO O ESPÍRITA DEVE ATUAR NA POLÍTICA:

-O espírita pode e deve estudar e reflexionar sobre os princípios político-filosófico-espíritas no Centro Espírita, pois eles estão contidos em O Livro dos Espíritos, Parte Terceira, das Leis Morais;

-Através da análise, do estudo e da reflexão das normas e princípios acima referidos, o espírita deve identificar o egoísmo, o orgulho e a injustiça nas instituições humanas, denunciando-as e agindo para que elas desapareçam da sociedade humana;

-Confrontar os fundamentos morais e objetivos do Espiritismo com os fundamentos morais e objetivos dos partidos políticos, verificando de forma coerente qual ou quais deve apoiar e até mesmo participar como membro atuante, se tiver vocação para tal;

-Participar de organizações e movimentos que propugnem pela Justiça, pelo Amor, pelo progresso intelectual, moral e físico das pessoas. Exemplo: clubes de serviços, associações de classes, diretórios acadêmicos, movimentos de respeito e defesa dos direitos humanos, etc;

-Fazer do voto um elevado testemunho de amor ao próximo;

Considerando que a sociedade humana é dirigida por políticos que saem das agremiações partidárias e suas influências podem ajudar ou atrasar a evolução intelecto-moral da humanidade, o voto, realmente, é uma forma de exprimir o amor ao próximo e à coletividade.

Deve, portanto, analisar se a conduta do candidato político-partidário tem maior ou menor relação com os princípios morais e políticos (aspecto filosófico) do Espiritismo;

-Participar de agremiação partidária, se tiver vocação para tal, sabendo, no entanto, da responsabilidade que assume nesse campo, já que sua militância deve sempre estar voltada para o interesse do ser humano, em seus aspectos social e espiritual. Para isso, sua ação política deverá estar em harmonia com os valores éticos (morais) do Espiritismo que, em última análise, são fundamentalmente os mesmos do Cristianismo;

-Participar conscientemente da ação política na sociedade, sem relegar o estudo e a reflexão do Espiritismo a plano secundário. Pelo contrário. O estudo e a reflexão dos temas espíritas deverão levá-lo a permanente participação, objetivando a aplicação concreta do Amor e da Justiça ao ser humano, seja individual ou coletivamente.

Para nós, a política é a ciência de criar o bem de todos e nesse princípio nos firmaremos.” Deputado Dr. Adolfo Bezerra de Menezes

BIBLIOGRAFIA E REFERÊNCIAS:

-Allan Kardec – O Livro dos Espíritos – tradução de J. Herculano Pires

-Allan Kardec – A Gênese – tradução de J. Herculano Pires

-Allan Kardec – Obras Póstumas – tradução de J. Herculano Pires

-Maria Eny – Rossetini Paiva – Religião e Atitudes Psicológicas

-Constituição da República Federativa do Brasil – Cap. 9 – artigo 5º